Acórdão do TRT da 18ª Região Publicado em 26.04.2012
Acórdão
Processo Nº RO-929-82.2011.5.18.0111
RELATOR : Desembargador GENTIL PIO DE OLIVEIRA
RECORRENTE : ENERGÉTICA SERRANÓPOLIS LTDA.
ADVOGADOS : ÂNGELA RODRIGUES CABRAL E OUTRO(S)
RECORRIDO : JEFFERSON VITORINO DOS SANTOS
ADVOGADOS : MILTON DANTAS PIRES E OUTRO(S)
ORIGEM : VT DE JATAÍ
JUIZ : LUCIANO LOPES FORTINI
EMENTA : HORAS EXTRAS. QUITAÇÃO SOB A RUBRICA DE GRATIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE REPETIÇÃO DO
PAGAMENTO. Evidenciado de forma inequívoca que ocorreu o pagamento do trabalho extraordinário, ainda que sob a rubrica de gratificação, e não ficando comprovado que a empregadora buscava fraudar os direitos dos empregados com essa prática, não há como impor à empresa a obrigação de realizar novo pagamento de igual natureza.
(1) O recurso ordinário patronal almejou a reforma da sentença de primeiro grau que condenara a empresa ao pagamento das horas extraordinárias, ao fundamento de que a quitação de horas extras sob título de gratificação é juridicamente inviável.
(2) Em seu recurso, a empresa aduzira que a condenação implica quitação em duplicidade, considerando que houve pagamento das horas extras laboradas efetivamente ainda que sob outro título.
(3) O Direito do Trabalho Brasileiro consagra o princípio de vedação à complessividade salarial, na medida em que proíbe a fixação de determinada importância para quitar vários direitos legais ou contratuais, conforme atesta o Enunciado 91 da Súmula do TST:
“SALÁRIO COMPLESSIVO. Nula é a cláusula contratual que fixa determinada importância ou percentagem para atender englobadamente vários direitos legais ou contratuais do trabalhador.”
(4) O salário complessivo é aquele salário que não discrimina as parcelas que o compõem, sendo inaceitável porquanto impossibilita a verificação do valor e a identificação da natureza de cada parcela da remuneração paga.
(5) Entretanto, a despeito da incidência jurídica do princípio de vedação à complessividade salarial, , dentro do espectro do Direito do Trabalho Brasileiro, prevalece soberano o princípio da primazia da realidade, que, de acordo com Mario de La Cueva[1], assinala que o contrato de trabalho é um contrato realidade, pois existe não como um acordo abstrato de vontades, mas como a realidade da prestação de serviços, isto porque é o trabalho em si que determina o conteúdo do pacto laboral.
(7) Como consequência do princípio da primazia da realidade, o Direito do Trabalho opera e valora a transcendência das formas em razão do conteúdo, consagrando que prevalece a real natureza do que é praticado em detrimento do que fora pactuado ou mascarado.
(8) Para o Direito do Trabalho, pouco importa o nome utilizado para definir o fenômeno jurídico almejado pois o que realmente o define é sua natureza jurídica em execução.
(9) No caso em comento, a análise exauriente dos documentos acostados (contracheques) revelou que os valores pagos sob a rubrica “gratificação” correspondiam à contraprestação pecuniária variável e proporcional às horas extras efetivamente cumpridas e assinaladas nas folhas de ponto que restaram incólumes.
(10) Ainda que o empregador tenha quitado equivocadamente as horas extras, valendo-se de denominação errônea, a natureza jurídica da parcela quitada e sua vinculação formal às horas extras consagradas nas folhas de ponto desautorizam a obrigação de quitar as horas extras em duplicidade.
(11) Numa palavra, nem sempre quem paga mal paga duas vezes.
[1] PLÁ RODRIGUEZ, Américo. Princípios de Direito do Trabalho (trad. de Wagner D. Giglio). São Paulo, LTr e Editora da Universidade de São Paulo, 1978, p.217.
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